segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Atlhetico Hygienico 1916, quem diria? Quem imaginava? Que surpresa, hein?
A história dos clubes de futebol são por demais curiosas. Elas caminham em sintonia com a história da formação das cidades e Estados que os clubes fazem parte. Tudo se envolve, pois, o futebol, é parte da tradição e do imaginário popular.       
Recentemente, um assunto no mínimo curioso veio à tona em Minas Gerais. Trata-se do antigo “Club de Sports Hygiênicos”, um clube que, segundo a Revista Vita, em novembro de 1913, era uma “brilhante associação recentemente fundada nessa capital e destinada a ser um ponto chic de reuniões das famílias da nossa elite”.
Fotografia tirada no Club de Sports Hygienicos, vendo-se senhoras, senhoritas e cavalheiros da nossa alta sociedade” Fonte: VITA, 26 jul. 1914. In: Constituição e enraizamento do esporte na cidade: Uma prática moderna de lazer na cultura urbana de Belo Horizonte (1894-1920). pág 180.

Este assunto emergiu justamente após o momento que o Cruzeiro resgatou suas tradições populares por meio de uma bela campanha. A entrevista do vice-presidente e a faixa na parte central do Mineirão com os dizeres “Cruzeiro, o time do povo”, despertou sentimentos variados. Principalmente pelo lado dos torcedores do Atlético de Minas, que até então, alimentados por boa parte da imprensa do Estado, se imaginavam como a única “massa” da cidade, mesmo com toda a ordem mundial estabelecida e concreta mostrando o contrário. Logo o ódio que os atleticanos mineiros nutrem pelo Palestra/Cruzeiro desde a década de 1920 voltou à ativa. Veio o desespero: “Se o Cruzeiro é de fato e comprovadamente o time do povo, o que nos restará, já que discutir futebol com eles não dá?”  É o que se imagina raciocinado pelo estilo atleticano mineiro de ser. Ou quem não se lembra do “nós não gostamos de títulos, gostamos de torcida”. Pois e agora, quais as origens desta torcida e clube? O atleticano mineiro foi esvaziado pelo time do povo. Vive agora uma de suas maiores crises existenciais. Perdeu o sentido.
Houve, este ano, um fenômeno nas redes sociais. Uma popularização do debate sobre as origens dos clubes na web e nas ruas. O interesse pela história e origens dos clubes ganhou boa parte dos debates entre as torcidas. E eis que, como resultado disso, de forma surpreendente, emergiu a história do Club de Sports Hygiênicos.
Mas quem é este tal de Hygiênicos afinal de contas? Pelo que consta em documentos e pesquisas, foi um clube da alta elite de Belo Horizonte fundado em 1913, que se instalou no Parque Municipal. Alguns jornais da cidade inclusive criticaram o fato da ocupação de um espaço público para o uso restrito da elite sem benefício geral para o restante da população, sobretudo os mais pobres. Porém, ainda assim, sobretudo pelo poderio econômico, o Hygienicos conseguiu se apoderar do parque público.

         Mas esta não é definitivamente a maior polêmica. Esta reside sim no fato de que, para a surpresa de muitos, o Hygienicos, como consta em alguns documentos que circularam na rede, se fundiu em 1916 com outro clube da então jovem capital mineira: o Atlhetico Mineiro. Tal fato até então poderia passar despercebido, mas para quem conhece a rivalidade em Minas Gerais, já percebeu que os atleticanos mineiros adoram, talvez por falta de argumentos mais plausíveis, tentar transformar a mudança do nome do Cruzeiro, que antes era Palestra Itália, em motivo de chacota, desconsiderando o fato que na verdade os cruzeirenses muito se orgulham desta mudança, já que foi a forma que o clube encontrou para sobreviver a II Guerra Mundial quando grupos xenófobos tentaram destruí-lo.
           Por este e outros motivos, agora, os cruzeirenses questionam as origens aristocratas do rival perante uma campanha de boa parte da imprensa local que em anos tenta transformar a torcida do Atlético Mineiro em massa. Porém, no que se refere as origens, podemos perceber que, além de ser um clube de raízes elitistas e aristocratas, ainda teve a capacidade de se fundir com outro mais elitista e aristocrata ainda!

        Tal situação pode explicar, e muito, os motivos de, a princípio, o Palestra Itália ter sido um clube exclusivo para a colônia de imigrantes italianos. É que muitos clubes da cidade pareciam não querer se misturar com aquela “gentalha” pobre de imigrantes. Resultado que parece lógico: o Palestra ganhou os corações do povão de Belo Horizonte, justamente, por ser o clube que não compactuava com uma elite possivelmente muito opressora. São causos do nosso futebol!
Atlhetico Hygienico, caramba! Por esta nem mesmo a massa inventada pela imprensa mineira esperava! Imaginem dois vovôs, um cruzeirense e outro atleticano mineiro, contando para seus netinhos a história dos clubes! No mínimo cômico, seria o vovô atleticano mineiro dizer que é massa, mais suas origens são aristocratas e higiênicas, enquanto o vovô cruzeirense dirá que seu clube nasceu do povo e se tornou a maior potência futebolística e maior paixão idolatrada por todas as classes sociais do Estado.
A história, por vezes, machuca. Entende-se.
CRUZEIRÃO DO POVÃO!

Geovano Chaves
Outubro de 2015

Ps. Para aqueles que possam duvidar das informações, reiteramos que não é nosso intuito inventar situações, como alguns assim o fazem. Para tanto, apresentamos pesquisas fundamentadas sobre o tema e também respectivos trechos das mesmas. Estamos à disposição para maiores esclarecimentos.
Mais informações sobre o tema:
. Club Esportes Higienicos: Esporte para a elite.
. Atletico Mineiro já foi Club Sports Hygienicos: conheça a história da fusão dos dois clubes da elite belo-horizontina:
. Apropriação do Parque Municipal para esportes da elite:
https://tidirparquemunicipal.wordpress.com/tag/futebol/
. Constituição e enraizamento do esporte na cidade: Uma prática moderna de lazer na cultura urbana de Belo Horizonte (1894-1920)

No artigo “Memórias do Club de Sports Hygienico”, escrito por Renan Vinicius Magalhães e Maria Cristina Rosa,  na página 06, encontra-se a seguinte passagem:
“No Minas Geraes (13 de abril de 1913, p. 5), de domingo, aparece uma pequena nota sobre “Um grupo de distinctos cavalheiros” que projeta “[...] fundar dentro de poucos dias um club de sports [...]”, ou seja, a pretensão já é explicitada a mais de um mês antes de sua fundação. Nessa nota já é posta a relação que o Clube teria com a educação e a higiene, pois é projetado um lugar “onde as familias dos associados encontrem, além de um ponto de palestra, exercicios physicos reclamados pela hygiene”.
A descrição “distinctos cavalheiros” não é qualificação de qualquer pessoa, ela se refere a pessoas que têm posição privilegiada no meio social, como é o caso dos fundadores do Hygienicos, como será demonstrado mais a diante enfatizando as áreas de atuação dos mesmos bem como o prestígio social.”
Link: http://congressos.cbce.org.br/index.php/conbrace2011/2011/paper/viewFile/3786/1691

Também no artigo “Memórias do Club de Sports Hygienico”, escrito por Renan Vinicius Magalhães e Maria Cristina Rosa,  na página 10, encontra-se a seguinte passagem:
“No campeonato de futebol de 1916, um fato causou polêmica entre os clubes: trata-se da fusão entre os times do Hygienicos e do Athletico Sport Club, uma vez já iniciado o campeonato. No jornal “As 10 11 alterosas” de 4 de novembro de 1916, a matéria “A Nota Esportiva” é dedicada a esse assunto. Segundo o autor da matéria: “O fim principal dessa alliança é fortalecer o Athletico Mineiro afim de que o America não tire o campeonato. A diferença entre elles é de „um ponto‟, estando o America em primeiro logar” (As Alterosas, 4 nov. 1916, p.6). Além da pluralidade de práticas esportivas, o Hygienicos também desenvolvia atividades no Parque Municipal, o que segundo Ribeiro (2007, p.73) foi a retomada de um “antigo” espaço do esporte em Belo Horizonte.”
Link: http://congressos.cbce.org.br/index.php/conbrace2011/2011/paper/viewFile/3786/1691

CRUZEIRO: O TIME DO POVO DE MINAS GERAIS!









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